por Ramesh Jaura
Berlim, Alemanha e Tóquio, Japão, 11/8/2015 – Setenta anos depois dos bombardeios atômicos sobre as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, um mundo livre de armas nucleares parece muito distante. Relembrando os dois acontecimentos, ocorridos nos dias 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente, os prefeitos das duas cidades apelaram fervorosamente para uma maior consciência mundial sobre a urgente necessidade de abolir completamente as armas atômicas.
As bombas que há 70 anos destruíram Hiroxima e Nagasaki deixaram mais de 200 mil mortos devido à radiação nuclear, as réplicas das explosões e a radiação térmica. Mais de 400 mil pessoas faleceram desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) devido aos efeitos secundários dos bombardeios. No dia 31 de março de 2015, o governo japonês havia reconhecido 183.519 hibakusha, como são conhecidos os sobreviventes das duas explosões atômicas, a maior parte deles residente no Japão.
A Lei de Alívio dos Sobreviventes da Bomba Atômica do Japão os define com pessoas que estavam a poucos quilômetros dos epicentros das bombas, a dois quilômetros dos epicentros nas primeiras duas semanas posteriores aos bombardeios, expostas à radiação após a explosão, ou que ainda não haviam nascido mas suas mães grávidas pertenciam a qualquer das outras categorias.
Durante os atos de recordação em Hiroxima e Nagasaki, notícias divulgadas por vários meios de comunicação confirmaram que aqueles bombardeios não tiveram nenhuma justificativa militar.
Gar Alperovitz, ex-professor da cátedra Lionel R. Bauman de economia política na Universidade de Maryland, escreveu no jornal The Nation que “a guerra estava ganha antes de Hiroxima, e os generais que lançaram as bombas sabiam disso”. Citou o almirante William Leahy, chefe do Estado Maior no governo do presidente Harry Truman, que ordenou o ataque nuclear após ter assumido a Presidência, em abril de 1945, e governou o país até 1953.
Em suas memórias, publicadas em 1950 com o título Eu Estive Ali, Leahy escreve: “O uso dessa arma bárbara em Hiroxima e Nagasaki não foi de ajuda material em nossa guerra contra o Japão. Os japoneses já estavam derrotados e prontos para se renderem…”.
O general Dwight Eisenhower, comandante supremo das forças aliadas na Europa durante a Segunda Guerra e presidente dos Estados Unidos entre 1953 e 1961, compartilhou esse ponto de vista. Em suas próprias memórias diz que, quando o secretário da Guerra, Henry Stimson, o notificou da decisão de usar armas atômicas, isso lhe causou sérias dúvidas, antes de tudo porque acreditava que “o Japão já estava vencido e que lançar a bomba era completamente desnecessário”.
Inclusive o famoso “falcão” e major-general Curtis LeMay, chefe do Comando de Bombardeiros Número 21, declarou à imprensa no mês posterior ao bombardeio que “a bomba atômica não teve absolutamente nada a ver com o fim da guerra”, segundo escreveu Alperovitz.
“Os povos deste mundo devem se unir ou morrerão”, alertou Robert Oppenheimer, amplamente considerado o pai da bomba, ao exortar os políticos a colocarem sob rígido controle internacional o poder aterrador das armas atômicas. Mas isso ainda não acontece.
Em seu fervoroso discurso, no dia 6 deste mês, Kazumi Matsui, prefeito da cidade de Hiroxima, afirmou: “Nosso mundo ainda está repleto de mais de 15 mil armas nucleares, e os políticos de Estados nucleares estão presos em um pensamento provinciano, repetindo nas palavras e nos fatos sua intimidação nuclear”. Enquanto existirem armas nucleares, qualquer um poderá se converter em hibakusha a qualquer momento, destacou.
Como presidente da organização Prefeitos pela Paz, Matsui disse que “Hiroxima atuará com determinação, fazendo tudo o que estiver ao nosso alcance para acelerar a tendência internacional para as negociações por uma convenção sobre armas nucleares e pela abolição das armas nucleares até 2020”. Este foi o primeiro passo para a abolição das armas nucleares, acrescentou. O próximo seria criar, mediante a confiança já ganha, sistemas de segurança amplamente versáteis que não dependam do poderio militar.
Na Declaração de Paz de Nagasaki, divulgada no dia 9, o prefeito dessa cidade, Tomihisa Taue, pediu ao governo japonês e ao parlamento que considerem “uma conversão de um guarda-chuva nuclear em um guarda-chuva não nuclear”. O Japão não possui nenhuma arma atômica e está protegido, como Coreia do Sul e Alemanha, bem como a maioria dos Estados membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), pelo guarda-chuva nuclear dos Estados Unidos.
Taue também pediu que o governo japonês estude medidas de segurança nacional que não dependam da dissuasão nuclear. “A criação de uma Zona Livre de Armas Nucleares no nordeste da Ásia, como defendem pesquisadores nos Estados Unidos, Japão, Coreia, China e em muitos outros países, tornaria isso possível”, afirmou.
O prefeito de Nagasaki lamentou que a Conferência de Revisão das Partes do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), realizada este ano na Organização das Nações Unidas (ONU), não tenha conseguido consenso para um documento final. Muitos países presentes nessa conferência concordaram que era importante visitar Hiroxima e Nagasaki.
Assim, o prefeito da segunda cidade bombardeada pediu “ao presidente Obama, aos chefes de Estado, incluindo os dos Estados nucleares, e a todos os povos do mundo, o favor de virem a Nagasaki e Hiroxima e verem pessoalmente exatamente o que aconteceu há 70 anos” sob o cogumelo nuclear.
Até agora, nenhum presidente dos Estados Unidos participou de um ato de recordação do bombardeio atômico sobre Hiroxima. A subsecretária de Estado para o Controle das Armas e a Segurança Internacional, Rose Gottemoeller, foi a funcionária norte-americana de maior status na cerimônia do dia 6 deste mês. Na ocasião afirmou à imprensa que as armas nucleares não deveriam ser usadas nunca mais. Envolverde/IPS